O rejeito da barragem B1 da Vale, que se rompeu em Brumadinho, deixando 270 vítimas, será recolhido pela mineradora e despejado dentro da mina do Córrego do Feijão, na mesma região onde a estrutura entrou em colapso, em janeiro deste ano.
A operação foi autorizada pela Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável) nessa sexta-feira (27). Ao todo, serão 7 milhões de metros cúbicos de rejeitos depositados dentro da mina. A licença para exercer atividade de Disposição de Rejeito em Cava, que foi autorizada pela secretaria, tem validade de 10 anos.
A cava do Córrego do Feijão atualmente está com as operações paralisadas por conta da tragédia. O rejeito que se espalhou em Brumadinho tem sido empilhado em locais temporários em regiões operadas pela Vale.
A mineradora fará o transporte do rejeito para dentro da cava por meio de na caminhões – durante o período chuvoso o processo poderá ser feito por drenagem. O Corpo de Bombeiros, que ainda trabalha para encontrar 11 vítimas desaparecidas na região, vai acompanhar o processo da Vale.
De acordo com a secretaria, a mineradora apresentou estudos e projetos para a gestão de resíduos e monitoramento da cava. “Estes estudos foram avaliados pela Feam (Fundação Estadual do Meio Ambiente) e pelo Igam (Instituto Mineiro de Gestão das Águas) que emitiram relatório técnico que subsidiaram a decisão da Semad”, diz em nota (confira na íntegra abaixo).
Ao BHAZ, o professor Carlos Barreira Martinez, fundador do centro de pesquisas hidráulicas da UFMG e especialista em barragens, disse que a ação pode ser considerada razoável.
“Tudo depende de como vão recolocar os rejeitos. É uma operação que funciona basicamente assim: retira-se o minério da lama e coloca o rejeito de volta no local de origem que é a cava. Com uma boa composição, em breve, a região estará reflorestada”, explica o professor.
Lição do passado
Ainda de acordo com o professor, o processo de transposição proposto pela Vale em Brumadinho evita casos como a mina de Águas Claras, que fica em Nova Lima, “nas costas” da Serra do Curral, um dos pontos turísticos de Belo Horizonte.
Região do bairro Mangabeiras e a mina de Águas Claras vista por cima (Reprodução/StretView)A extração de minério de ferro na região “oculta” da serra ocorreu entre 1973 e 2002, quando o complexo pertencia à MBR (Minerações Brasileiras Reunidas). A extração teve fim e a cava não foi drenada, formando um lago com aproximadamente 150 metros de profundidade e com a água contaminada por minério. A área foi adquirida pela Vale em 2006, onde atualmente funciona a sede administrativa da empresa.
“Se não voltar com o rejeito – em Brumadinho – vai encher de água, assim como Águas Claras, que é um problema para o futuro. Ali, dependendo do nível da água, pode haver uma instabilidade no local. E o detalhe é que é uma área que está praticamente dentro de Belo Horizonte, em cima da capital. Então, para o futuro, é algo que precisa ter uma solução estudada”, conta.
Barragem desfeita
A Vale anunciou no início do mês o fim do processo de descomissionamento da Barragem 8B, também na Mina de Águas Claras. A estrutura, que foi construída com método à montante, considerada o mais perigoso, é a primeira de outras nove barragens que a mineradora prometeu desativar.
A barragem 8B foi substituída por um “lago de pedra”, com 50 mil toneladas de pedras. Agora, a mineradora promete refazer 12,7 mil metros quadrados de vegetação, com mudas de espécies nativas da região.
As outras oito barragens já estão incluídas no processo de reintegração, e a próxima estrutura a ser descomissionada será a de Fernandinho, que fica em Nova Lima. A previsão é que o desmonte seja concluído no fim do ano que vem.
O BHAZ tentou contato com a Vale para entender mais detalhes sobre o processo de manejo do rejeito de Brumadinho e sobre os descomissionamentos, contudo, não obteve retorno até o fechamento desta matéria.
Nota da Semad
“Foi autorizado nessa sexta-feira (27/12), pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), à VALE – MINA CÓRREGO DO FEIJÃO, licença para exercer atividade de Disposição de Rejeito em Cava. O volume total solicitado de disposição na cava de Feijão é de 7.000.000 m³ com ocupação de 124,47 ha, sem necessidade de supressão de vegetação. A validade da licença é de 10 anos.
O processo foi formalizado na Superintendência de Projetos Prioritários (Suppri) da Semad em 19 de dezembro de 2019. Por possuir potencial poluidor médio e porte pequeno o empreendimento foi enquadrado na classe 2. Conforme Deliberação Normativa COPAM 228/2018, no art. 1º, § 4º
“I – para a atividade enquadrada nas classes 2 ou 3, aplica-se o licenciamento ambiental simplificado, nos termos do inciso II do §4º do art. 8º da Deliberação Normativa Copam nº 217, de 2017;
Parágrafo único − Não haverá a incidência de critérios locacionais de enquadramento para as atividades descritas no caput quando estiverem inseridas em área já licenciada. ”
A licença solicitada foi enquadrada na modalidade de licenciamento Ambiental Simplificado (LAS/RAS).
Para a concessão da licença foi solicitado apresentação de estudos hidrogeológicos, bem como os procedimentos de gestão de resíduos e monitoramento da cava. Estes estudos foram avaliados pela Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) e pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) que emitiram relatório técnico que subsidiaram a decisão da Semad.
A lavra da mina Córrego do Feijão encontra-se paralisada em decorrência do rompimento da barragem B1. Atualmente, as operações da Vale realizadas na área se restringem às obras emergenciais de engenharia e meio ambiente para mitigação dos impactos decorrentes do rompimento da Barragem I.
O rejeito extravasado da Barragem I vem sendo disposto na Pilha de Menezes III e temporariamente na Pilha União (Mina de Jangada), além de uma nova pilha que está operando na região da antiga pera ferroviária – PDR-TCF.
A disposição na cava é considerada ambientalmente correta pois, além de ser realizada em uma área tecnicamente segura, sem a necessidade de construção de barramentos, diques ou novas estruturas de contenção, é uma área antropizada, o que reduz o impacto ambiental, visual e facilita a recuperação da área, quando do seu descomissionamento.
A atividade de transporte e disposição de rejeito na cava será realizada por meio de caminhões, mas a Vale estuda a possibilidade de, no período chuvoso, realizar a disposição por meio de dragagem. Toda operação de carga, remanejo, triagem e disposição de rejeitos é acompanhada pelo Corpo de Bombeiros e as áreas somente são trabalhadas após liberação pelos mesmos. Inicialmente é realizada triagem com revolvimento do rejeito no próprio local de deposição ou em área próxima. Em seguida, realiza-se a separação dos resíduos perigosos, metálicos, veículos, madeiras, entre outros, e procede-se a destinação temporária.
Diversos monitoramentos adicionais serão realizados ao longo do processo e fazem parte das condicionantes para a licença acompanhamentos como:
*Apresentar, relatório anual da disposição dos rejeitos, as medidas de controle ambiental aplicadas, cumprimento de programas de monitoramento conforme apresentado no RAS e possíveis medidas corretivas adotadas.
*Apresentar relatório dos resultados obtidos da caracterização dos rejeitos coletados na área impactada pelo rompimento da Barragem BI.
*Apresentar comprovação da formalização das atualizações sistemáticas do modelo numérico com base nos resultados de monitoramento obtidos, e considerando as adequações solicitadas pela Feam em parecer.
*Seguir as recomendações técnicas apresentadas no Relatório Técnico da Feam.*Programas de automonitoramento das águas superficiais e subterrâneas; dos Efluentes atmosféricos e de ruídos e vibração”.
Fonte: Bhaz