A aceleração na transição para energias limpas irá demandar cada vez mais recursos minerais imprescindíveis na fabricação de turbinas eólicas, painéis solares, baterias e veículos elétricos.
Entretanto, a volatilidade de preços e a alta concentração da produção dessas matérias-primas em poucos países podem colocar um freio no desenvolvimento das renováveis.
Publicado esta semana, relatório (disponível no origina em .pdf) da Agência Internacional de Energia (IEA, sigla em inglês) aponta que somente a demanda por lítio, por exemplo, deve crescer mais 40 vezes nas próximas duas décadas.
Grafite, cobalto e níquel terão uma demanda entre 20 e 25 vezes maior, na comparação com o mercado atual.
“Isso pressionará a transição energética, tornando-a mais custosa se não tomarmos medidas necessárias, pelos governos e indústrias”, declarou o diretor executivo da IEA, Fatih Birol, na quarta (12), durante evento com representantes da mineração mundial e ministros de Estado.
Segundo ele, medidas que garantam a disponibilidade de minerais na cadeia de suprimento global estão alinhadas ao compromisso mundial no alcance das metas de descarbonização previstas no Acordo de Paris.
“Minerais críticos são essenciais para tornar o sistema de energia limpa de amanhã funcionar. Sem os minerais, sem eles serem os ingredientes do sistema de energia do futuro, podemos não ter sucesso em alcançar nosso curso climático”, disse Birol.
Demanda e preços
Para o coordenador do estudo, Tae Yoon Kim, há recursos minerais suficientes para suprir o crescimento esperado da demanda, “mas isso não é garantia de disponibilidade e preços acessíveis”, diz.
Kim estima que um carro elétrico típico requer seis vezes mais recursos minerais que um convencional. Da mesma forma que uma eólica offshore necessita 13 vezes mais recursos minerais que uma planta a gás com capacidade similar de produção.
“Com o Acordo de Paris, nós veremos quadruplicar a demanda por minerais até 2040, comparando com hoje (…) Uma transferência de energia ainda mais rápida para atingir globalmente a emissão líquida zero até 2050 pode exigir seis vezes mais minerais”, afirma Kim.
Essa alta abrupta na demanda poderia colocar fim à queda nos preços das energias renováveis observada ao longo da última década, segundo a IEA.
Insegurança energética
Além da pressão sobre os preços minerais como lítio, cobre e níquel, a concentração geográfica em poucos países na exploração e beneficiamento dessas matérias-primas acende um alerta em relação à segurança energética das fontes renováveis.
“Nosso relatório aponta que no caso de alguns minerais as cadeias de suprimentos para refiná-los estão concentradas em um número muito restrito de países (…) Olhar isso faz parte da nossa missão de segurança energética”, explicou Birol.
China, Austrália e República Democrática do Congo, por exemplo, controlam mais de três quartos da produção global de lítio, cobalto e terras raras.
O nível de concentração é ainda maior em relação ao refino, sendo a China responsável por 35% do processamento global de níquel, 50 a 70% para lítio e cobalto e quase 90% para terras raras.
O ministro da Economia e Indústria do Japão, Kiyoshi Ejima, presente no encontro, observou que o número de projetos lucrativos de mineração diminuiu em todo o mundo, enquanto os custos para desenvolvimento de novas minas está aumentando.
Tais fatores acarretam em um cenário ainda maior de concentração.
“Há sempre o risco de interrupções no fornecimento de minerais críticos, como terras raras, em que dependemos de países específicos, e espera-se que a competição internacional para acessá-los se torne ainda mais intensa”, acredita o ministro.
Em resposta a esse cenário, o Japão tem adotado algumas medidas estratégicas, como melhoria do sistema nacional de armazenamento, para amortecer possíveis interrupções no abastecimento, e vem trabalhando em cooperação com outros governos.
Recomendações
O relatório da IEA apresenta seis recomendações com o objetivo de garantir a estabilidade no suprimentos de minerais essenciais para a transição energética acelerada:
- Garantir o investimento adequado em fontes diversificadas na cadeia de abastecimento de minerais;
- Promover a inovação tecnológica ao longo da cadeia, permitindo o uso mais eficiente ou substituição de materiais;
- Aumentar a reciclagem dos materiais;
- Aumentar a resiliência da cadeia de abastecimento e desenvolver respostas a potenciais interrupções no fornecimento, como investimentos em capacidade de estocagem;
- Integrar critérios ambientais, sociais e de governança;
- Fortalecer a colaboração internacional entre produtores e consumidores, permitindo, por exemplo, realizar avaliações regulares de vulnerabilidades potenciais e possíveis respostas coletivas;
Críticas ao relatório
Para o Carbon Tracker, think tank que pesquisa o impacto das mudanças climáticas nos mercados financeiros, as estimativas da IEA “dão uma visão bastante pessimista” em relação à transição energética.
A entidade destaca que, ainda que as energias limpas necessitem de maior consumo de recursos minerais, o impacto ambiental é significativamente menor quando comparado ao sistema fóssil.
“O sistema fóssil requer mais de 300 vezes mais material do que o sistema renovável. A disparidade é enorme, e nenhuma quantidade de trabalho elaborado por apologistas do sistema de combustível fóssil deve nos desviar do ponto central de que temos os recursos para tornar a transição energética uma realidade”, afirmou em nota.