A mineração começou lá atrás com um geólogo que ia lá para o meio do mato com o seu martelo e ficava batendo nas pedras. Essa coisa mudou. A busca pelas riquezas escondidas no subsolo exige um criterioso trabalho de investigação, onde o investimento em inovação é fundamental. O presidente da Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM), Antonio Carlos Tramm, fala sobre as perspectivas da atividade no estado e de projetos para ampliar os investimentos em inovação e sustentabilidade no setor.
As notícias que a gente tem no Brasil sobre a mineração nem sempre são positivas. Entretanto, estamos falando de um setor importante para a economia. O que falta para o outro lado da atividade aparecer mais?
A atividade de mineração é essencial para o desenvolvimento de um estado como a Bahia e de um país como o Brasil. Apesar de termos alta tecnologia em algumas coisas, somos muito atrasados em outra. O Brasil tem um problema enorme de redistribuição de renda, com desemprego em níveis altíssimos. A mineração pode ocupar o espaço na geração de renda.
A maioria dos nossos minerais não está na costa, está no pobre do semiárido. Então, se conseguirmos implantar essas mineradoras lá, vamos trazer não apenas o desenvolvimento, mas dignidade para as pessoas. Porque quando as pessoas têm condições de prover o sustento das suas famílias, elas têm dignidade.
Estamos falando de uma atividade em que não é o empreendedor quem escolhe a localização…
Há 50 anos atrás, você tinha um nível de conhecimento sobre minérios que hoje é totalmente diferente. E daqui a 50 anos, você terá outro. Estamos falando de coisas hoje que muita gente nem sabia que existia lá atrás. As terras raras começaram a ser buscadas há pouco tempo. Veja, hoje a Bahia tem cerca de 50 minérios diferentes. Alguns de menor valor, outros de maior valor. Em alguns casos, em menor quantidade e em outros, maior, mas temos no nosso mapa mais de 50 tipos, que serão utilizados à medida em que o tempo passe e se encontrem usos para eles, a partir de processos de inovação.
A descoberta de novos usos, amplia o horizonte da atividade?
Exatamente. Veja, o pessoal da agricultura foi muito feliz ao dizer que tudo é agro. O peru é agro, o peixe é agro. Isso é verdade, mas veja, nós na área de mineração não tivemos a felicidade de dizer que tudo é mineral. A água que você está bebendo, o copo de vidro, a cadeira em que estou sentado tem um revestimento de couro, mas tem toda uma estrutura que é mineral. Não teríamos a revolução na área da informática sem os minerais. Veja que o presidente dos Estados Unidos, o (Donald) Trump, deu uma recuada na disputa comercial com a China após a ameaça de perder o acesso a terras raras, em que a China tem uma reserva enorme. Falta na área de mineração uma postura mais positiva, de assumir o seu papel. Faltou uma postura até política mais incisiva.
Diante dessa falha, recentemente a atividade sofreu dois golpes violentos em Mariana e em Brumadinho, que viraram notícia pelo lado negativo. Não se pode viver só de notícia ruim.
Como a Bahia está posicionada no cenário da mineração?
Hoje, nós somos o quarto estado em arrecadação de imposto pela produção mineral, mas isso quer dizer muito pouco. Qual é a mudança que nós vamos ter de posição? A implantação da Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste), que é a estrada de ferro que corta o estado e vai até o Porto Sul. Isso vai trazer a viabilidade de enviar o minério produzido na Bahia para fora. Se você produz diamante, você leva no bolso, numa mala, numa pasta, enfim, mas o minério de ferro você precisa de uma estrutura de transporte apropriada. E nós, na década de 50, implantamos o nosso desenvolvimento na base do transporte rodoviário. Acabamos com as outras opções. Fica caro para exportar.
A Fiol cortar a Bahia em direção ao mar, então toda essa área que tem minério será beneficiada. Isso vai modificar o nosso status.
Em que situação a Fiol vai colocar a Bahia?
Hoje, nós somos o quarto estado e podemos mudar para o terceiro, que é um grande pulo. Hoje é Pará e Minas, que devem continuar em nossa frente, depois vêm São Paulo e a Bahia. Nós podemos ganhar a terceira posição. Mas isso não é o principal, ser terceiro ou quarto. O importante é a atividade que isso vai trazer para a economia. Atualmente, minha venda de minério de ferro é praticamente zero. Se tenho jazidas de bilhões, vamos colocar para a rua. Isso é trabalho, é renda para as pessoas. Precisamos ver a mineração com um olhar desenvolvimentista e não como uma atividade predadora do meio ambiente. Se você analisar, a área física que uma jazida ocupa é mínima. É um grande buraco numa área de quatro a cinco quilômetros.
Esta percepção se deve a um problema de imagem, ou à maneira como as empresas se portam?
Eu acho que é a fome com a vontade de comer. As empresas não se prepararam para este cenário. Existe uma ideia de que o setor é o grande vilão, enquanto o outro lado é o bom. Os governos e a sociedade têm meios de criar uma convivência equilibrada entre o atendimento das demandas sociais, das demandas de sobrevivência da população e o meio ambiente.
Nós temos bons exemplos de projetos que conseguem este equilíbrio aqui no estado?
Temos sim. Os projetos minerais daqui, você olha a Caraíbas, olha a Ferbasa, Vanádio e vários projetos que conseguem conviver neste ambiente. O que nós precisamos é ampliar estas áreas para trazer benefícios para o geral. Dentro deste caminho é que estamos promovendo um seminário, cujo eixo é inovação e sustentabilidade. Nós temos que enfrentar este assunto.
Quando eu falo em sustentabilidade, não estou falando em algo que vai me beneficiar hoje, estou falando de algo que vai ser importante para os meus netos. Tem que ser resguardada porque é importante para o futuro, mas nós acreditamos que é possível e preciso aliar o desenvolvimento à preservação do meio ambiente.
Qual é a relevância econômica da mineração para a Bahia?
Como é para um produto exportável, normalmente não rende ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços), mas tem um impacto positivo muito grande na atração de investimentos e na geração de empregos. Agora mesmo, vamos assinar um contrato para a exploração de jazidas depois de cinco anos e até dezembro serão mais cinco. Isso gera empregos em regiões muito pobres. Veja, neste caso da jazida, serão investidos pela empresa mais R$ 4 milhões em pesquisas, depois disso serão feitos novos investimentos, trabalhadores contratados e royalties serão gerados para o estado.
Por que este intervalo de cinco anos sem projetos? É por conta do cenário econômico?
Esses ciclos mundiais, de altas e baixas, são uma constante. Você tem produtos que oscilam. O importante é ter um mínimo de planejamento. É preciso estar atento à situação internacional, da economia brasileira, mas é importante estar sempre se mexendo. Nós estamos trabalhando para encontrar novos tipos de minérios. Quando você fala em pedras ornamentais, nós temos o minério, mas não tivemos uma política do estado para a exploração aqui. Esta política foi implantada em Vitória (Espírito Santo), então, nossas pedras vão para lá, onde são trabalhadas e exportadas por lá.
É possível reverter este processo?
Com certeza pode-se reverter, mas isto demanda investimentos, mudança de cultura, tudo. Veja, o investimento inicial na área mineral é muito pesado, então esta prospecção que antigamente era o geólogo, com uma bota bonita, uma bússola e um martelo, mudou. O minério que era uma coisinha bem pequenininha, hoje, para confirmar todos os estudos feitos nos últimos anos, você precisa usar uma maquininha. De olho, não se descobre mais nada. Tem que ir lá embaixo. E isso demanda investimento muito grande e o Brasil não é habituado em investimentos nesta área. Para se ter uma ideia, o Brasil, deste tamanho, investe mais em prospecção que o Peru.
Aqui na Bahia, já há algum tempo, se destaca neste processo de pesquisas.
Nós temos um passado muito rico neste trabalho de prospecção, de identificação. Sem sombras de dúvidas, a CBPM é a companhia de pesquisa mineral mais bem dotada do país. Nossa riqueza de publicações é muito maior que a nossa riqueza em jazidas. São momentos que se vive. Eu quero olhar para a frente, espero que este cenário se modifique em breve.
Fonte: Jornal CORREIO