Há quase 10 anos, a exploração de calcário na cidade de Padre Bernardo (GO), no Entorno do Distrito Federal (DF), está envolvida em polêmica. Apesar de ter a portaria de lavra de uma área às margens da BR-251 desde 2011, o Grupo Pirineus enfrenta uma disputa judicial contra o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para conseguir explorar toda a extensão de que trata o aval da Agência Nacional de Mineração.
A disputa se dá porque parte da área em questão é um assentamento da reforma agrária chamado Boa Vista. Segundo o Incra, há riscos de impacto à população que vive no local, o que a autarquia apontou como motivo para negar a autorização de exploração. A mineradora foi à Justiça, mas ainda não há um veredicto (na última movimentação do processo, consta apenas que ele está “concluso para decisão” desde novembro do ano passado).
Enquanto a decisão não sai, a empresa se prepara para explorar a área – segundo ela, apenas na parte do terreno que é superficiária, ou seja, aquela que foi concedida pelos proprietários à mineradora, nas fazendas Coqueiro e Marajá, para que possam ser exploradas.
Domingos Sávio, proprietário do Grupo Pirineus, confirma que deu início à exploração, mas garante que ela só está sendo feita no superficiário. “Não estamos entrando no assentamento. Tentamos um acordo com o Incra, porque tínhamos direito pela lei a lavrar ali, mas não quisemos fazer isso. Resolvemos ir à Justiça Federal”, sustenta.
Segundo ele, o Incra tem conhecimento de que a lavra inclui a área do assentamento e “procurou detalhes” para negar a autorização. “Para mim, é querendo pedir outra coisa; mas a empresa é séria, temos programa de compliance, não entramos nisso aí”, continuou, sem explicar a que se refere a insinuação.
O empresário também defende que, sem calcário, a área do assentamento é improdutiva e que a instalação da mineradora poderia levar desenvolvimento a Padre Bernardo.
“Vamos gerar 140 empregos; contratar membros das famílias dos assentados, que inclusive nos procuraram; levar o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e o Sesi (Serviço Social da Indústria) lá para fazer cursos de mineração. O benefício vai ser enorme”, sustenta.
Incra
Para justificar o porquê de não conceder a autorização, o Incra aponta cinco motivos: inconsistência quanto à especificação da área pretendida; ausência de autorização para pesquisa no assentamento; falta de consulta da Secretaria de Meio Ambiente ao Incra para emitir licença; inexistência de avaliação e indicação de medidas para garantia da segurança e bem-estar da população assentada; e omissão na contrapartida aos moradores da área.
“O Incra entende que ainda não foram atendidas de forma clara as condições necessárias para que a autarquia possa expedir autorização para exploração de lavra no assentamento, especialmente no que concerne aos possíveis impactos da atividade sobre a população assentada, e as garantias relativas à sua segurança, além da necessária precaução e proteção do erário e dos direitos dos assentados relativos à justa indenização e/ou compensação decorrente da utilização da área pertencente ao assentamento e por eventuais transtornos causados.”
Quanto à demarcação da área, a empresa destacam que, no requerimento inicial, a mineradora pediu autorização apenas para explorar um lote do assentamento. O Incra solicitou uma análise da área cartográfica e constatou, entretanto, que ela abrangia parte de outro lote e da Reserva Legal do assentamento.
O órgão também diz não ter autorizado “qualquer pesquisa minerária relativa à existência de calcário e sua viabilidade econômica na área de sua propriedade” e alega não ter sido consultado, ainda que fosse dono do terreno, quando a antiga Secretaria de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura e Assuntos Metropolitanos de Goiás (Secima), hoje Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), concedeu licença ambiental.
Tampouco haveria, no processo, avaliação de riscos e detalhamento de medidas para “garantia da segurança e bem-estar da população assentada e circunvizinha”.
“Sabe-se que a atividade pretendida é causadora de impactos capazes de afetar significadamente a população próxima ao local (….) Existe, por exemplo, o risco de danos à saúde, provocados principalmente pela poeira oriunda da moagem das rochas, e o risco de danos físicos decorrentes do arremesso de fragmentos de rocha provocados pelas explosões”, contesta.
Licença vencida
Há, contudo, mais um complicador no processo: ao Metrópoles, a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) informou que a licença ambiental da empresa venceu em junho do ano passado – segundo a pasta, ainda não consta nenhuma iniciativa de renovação e já estão em andamento os procedimentos de embargo das atividades da mineradora.
Eles também informam que já multaram a empresa, em novembro de 2019, em R$ 25 mil, porque, na vistoria pós-licença, identificaram o “descumprimento de condicionantes estabelecidas previamente”. “Com a licença vencida, a empresa não poderia continuar com suas atividades, que inclusive já foram alvo de denúncias junto à Semad”, destaca a nota.
A pasta não detalhou a denúncia, mas, no Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO), consta uma que mostra o maquinário da mineradora já instalado no local. O documento ainda deve ser encaminhado à comarca de Cocalzinho para que o promotor avalie se dará ou não prosseguimento. Até o fechamento desta matéria, o processo ainda não havia sido movimentado.
Fonte: Metrópoles