Prestes a completar 185 anos de operação, a AngloGold Ashanti Brasil atravessou diferentes momentos políticos e econômicos desde que chegou ao País, em 1834. Ciclos do café e da borracha, industrialização, Milagre Econômico, Ditadura Militar, democracia, aprovação da Constituição Federal, crises financeiras, criação do Plano Real, boom da economia nos anos 2000 e a mais recente e grave crise econômica da história nacional são apenas alguns exemplos dos cenários vividos pela organização.
Para o diretor-presidente da AngloGold, Camilo de Lelis Farace, embora a empresa não necessariamente tenha passado ilesa por tantos e diferentes contextos, alguns diferenciais foram fundamentais para a manutenção e longevidade dos negócios. Segundo ele, os mesmos atributos, aliados a uma mineração cada vez mais responsável e investimentos vultosos em inovação e tecnologia permitirão que a companhia ultrapasse os 200 anos de operação.
O administrador de empresas está na AngloGold Ashanti há 29 anos. Em sua carreira executiva, Farace ocupou posições estratégicas nas áreas de gestão, finanças e operação em diferentes unidades do grupo no Brasil. É ainda membro do Conselho Diretor do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Conselho Estratégico da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) e Conselho da UHE Igarapava.
Em entrevista exclusiva ao DIÁRIO DO COMÉRCIO, o diretor-presidente da mineradora falou sobre a trajetória da companhia nos 185 anos de operação no Brasil e os desafios da empresa e do País em prol de um futuro promissor para a mineração.
Qual o balanço da AngloGold Ashanti ao completar 185 anos de operação no Brasil?
Essa longevidade é de grande relevância, já que no Brasil a maioria das empresas fecha as portas antes mesmo de completar um ano. Além disso, neste momento em que a mineração se transformou em um setor muito questionado e contestado, histórias como a da empresa nos leva a analisar as contribuições para a sociedade que uma organização como esta pode produzir ao longo do tempo. O tempo de atuação não quer dizer que a empresa foi sempre 100% correta, mas sim, que soube se reinventar, evoluir e encontrar alternativas aos desafios encontrados. Olhando para o futuro temos a mesma convicção de que ultrapassaremos os 200 anos de existência.
Quais foram os diferenciais da AngloGold neste período?
A capacidade de, através das pessoas, se reinventar nos momentos mais desafiadores. A garra, a determinação e a capacidade das pessoas que aqui se encontram e que buscam atuar da melhor forma para que o valor que a organização preconiza seja executado em sua plenitude. Queremos que as comunidades que nos hospedam possam ser melhores a partir da nossa existência, pois, para nós, a licença social é condição primordial para o negócio existir. Porque a AngloGold nunca foi resultado de poucas pessoas; sempre foi consequência da totalidade das pessoas. E é essa energia que proporcionou esta empresa chegar aonde chegou. Aliado a recursos, reservas e eficiência na gestão.
Como a mineradora trabalha a exaustão dos recursos? Há reaproveitamento dos rejeitos?
Não investimos no reaproveitamento de rejeitos, porque o nível de eficiência de recuperação com o qual a empresa atua já está no limite de capacidade da tecnologia e, tecnicamente, não existe margem para obter resultados diferenciados e agregadores. Mas, o que, de fato, nos indica que teremos mais anos de longevidade é o fato de a organização acreditar no Brasil, nas pessoas e investir fortemente em exploração.
Inclusive, recentemente a empresa anunciou aportes de US$ 120 milhões para o Brasil. A maior parte será destinada a exploração?
Hoje, de maneira geral, os investimentos da empresa estão basicamente focados em três grandes pilares: exploração, desenvolvimento e tecnologia, para que tenhamos ganhos de produtividade e competitividade, além de segurança para os colaboradores. Somente em 2018 investimos mais de R$ 100 milhões em pesquisas no País. Mas a mineração, por natureza, é uma atividade de investimentos contínuos e a mineração subterrânea, ainda mais. O valor de US$ 120 milhões representa a manutenção de nossas operações, com aplicação em equipamentos, sondagem e demais áreas. A porção de exploração e desenvolvimento será expressiva dentro deste montante.
Como estão os níveis de produção da AngloGold e quais as perspectivas para 2019?
Para 2019 temos uma perspectiva mais favorável. A expectativa é de um resultado entre 5% e 7% melhor neste exercício em relação ao ano passado, quando tivemos um volume menor. Estamos recuperando os níveis de produção e o resultado final vai ser suficiente para retomar aos patamares de 2017.
A cotação do ouro está ajudando?
O mercado vivenciou uma situação crítica depois de 2012, quando o ouro chegou a US$ 1.800 a onça, e desabou a quase US$ 1 mil, entre 2015 e 2016. Depois houve reação e, há cerca de 20 dias, o ouro chegou a ultrapassar a barreira dos US$ 1.400. Isso ocorreu, obviamente, em função de uma conjuntura externa, dependente da política econômica americana e efeitos comerciais entre as grandes potências internacionais. Mas ainda não pode ser considerada uma tendência para o futuro.
Como está o mercado internacional?
De maneira geral, a produção global do produto cresceu, mas a elevação não tem sido constante. Hoje a relação de oferta e demanda ocorre em função do volume existente nos estoques dos bancos centrais mundo afora. De toda maneira, o consumo também tem crescido e está gerando demanda e elevando os preços no mercado internacional. Há uma perspectiva favorável para o nosso setor.
O mercado interno também tem ajudado?
A grande oscilação ocorre em função do câmbio. A manutenção ou não do nível em que se encontra depende de questões internas como a reforma da Previdência e outras medidas do governo para que a moeda possa ter movimentação significativa. Em suma, o Brasil precisa ficar atento para a mineração de ouro e sua real capacidade para expandir a produção. O Brasil produz hoje cerca de 80 toneladas por ano e se encontra em 12º lugar na produção mundial. Potencialmente e geologicamente o País poderia estar em situação muito melhor.
E sob a ótica conjuntural?
A grande dificuldade diz respeito à atração de mais e grandes investidores. Infelizmente o País passa por mudanças frequentes na legislação, o que gera instabilidade regulatória e insegurança jurídica. Com a criação da Agência de Mineração o Brasil vai conseguir evoluir com mais rapidez e consistência nas questões legais, criando um ambiente mais favorável para o negócio de mineração de ouro. Para se ter uma ideia, a mineração subterrânea representa hoje 4% da mineração brasileira, ao passo que, globalmente, o setor já atinge 16% na produção total. Isso mostra que o Brasil está muito distante do que já existe no mundo.
Em que medida o cenário político e econômico brasileiro implica nas ações e perspectivas da empresa?
Sempre que há um novo governo as expectativas são enormes, pois as mudanças estruturais discutidas no período eleitoral propiciam uma capacidade favorável de avanços e melhorias. A AngloGold tem grandes expectativas de que haverá evoluções importantes tanto em âmbito federal quanto estadual.
Como vê a atual situação da mineração no Brasil?
Antes mesmo dos rompimentos das barragens, a mineração brasileira já recebia um questionamento alto da sociedade, muito em função de não conseguir se comunicar bem. Com os ocorridos em 2015 e no início deste ano, isso se agravou muito. Mas existe uma preocupação na responsabilidade de promover uma melhoria efetiva, principalmente, porque o Brasil é altamente depende do setor e Minas Gerais ainda mais. É grande a responsabilidade de fazer com que as mudanças sejam feitas e garantam condições melhores para o desempenho das empresas de mineração, no sentido de prover o nível máximo de segurança. Afinal, a mineração é essencial para nossa vida, mas tem que ser bem feita.
Qual a situação das barragens da AngloGold?
A AngloGold tem seis barragens em Minas Gerais, sendo cinco a jusante e uma em linha de centro. A empresa atua de maneira criteriosa em relação aos projetos, execução e gestão da disposição dos rejeitos e em 185 anos de operação nunca registrou rompimentos.
A empresa continua investindo de maneira forte na premissa de evoluir. Para tanto, no ano passado iniciou os processos de licenciamentos para o projeto de empilhamento a seco e todos estão sendo executados dentro do contexto atual da mineração no Estado, que é delicado, dado os últimos acontecimentos relacionados aos rompimentos das barragens.
Fonte: Diário do Comércio